SINDPOLF/SP repercute nota da Associação Nacional dos Escrivães de Polícia Federal sobre o recente caso: "Escrivão é preso por delegado por usurpação de função na RMC" ocorrido no dia 08 de junho.
A Associação Nacional dos Escrivães de Polícia Federal manifesta-se publicamente a respeito do recente caso "Escrivão é preso por delegado por usurpação de função na RMC", ocorrido no dia 08/06/2018 no Paraná. Link da reportagem
O "casamento" está um inferno, mas a o divórcio está difícil de sair.
Não é de agora que este relacionamento vai de mal a pior. Estamos falando de uma relação pensada em outro contexto (meados do século passado) e, assim como o ultrapassado inquérito policial, já deveria ter deixado de existir.
Nos referimos à dupla que trabalha nos autos dos inquéritos policiais: o delegado e o escrivão.
Na verdade, tanto o inquérito quanto a estrutura organizacional de uma polícia pautada na burocracia e longe de ser eficiente é mantida por interesse único e exclusivo de uma classe policial, a dos delegados.
Às vezes é preciso algum evento "estranho" acontecer para que se evidencie o absurdo, se escancare a desordem, a desarmonia, a incoerência.
Esse evento referido acima ocorreu nesta última sexta-feira, na Delegacia de Fazenda Rio Grande/PR, na região metropolitana de Curitiba/PR.
Um escrivão de polícia foi preso acusado de usurpação de função pública e desobediência. De acordo com o boletim de ocorrência, a situação aconteceu durante a apreensão de um adolescente, na qual o escrivão teria atuado em desacordo com as orientações do delegado.
Mesmo sem entrar a fundo no ocorrido, para evitar conclusões precipitadas, é possível e oportuno se fazer algumas considerações e trazer à baila um pouco de uma realidade desconhecida da imensa maioria do povo brasileiro.
Quem já teve seu veículo ou residência furtados sem autoria conhecida, por exemplo, e foi até uma delegacia de polícia noticiar o ocorrido, pode perguntar a si mesmo: o que foi feito a respeito? Houve investigação? Ou só foi lavrado um boletim de ocorrência para fins de cobertura de eventual seguro?
Pois o modelo de investigação no país revela sua ineficiência em todos os detalhes.
Pesquisas oficias e não oficiais apontam a eficiência do modelo investigativo brasileiro (inquérito policial) em menos de dois dígitos percentuais, ou seja, mais de 90% dos crimes cometidos não têm seus autores responsabilizados. Eis o retrato da impunidade em nosso país.
Na maioria das delegacias do Brasil, os inquéritos policiais, quando existem, são conduzidos, em tese, pela dupla delegado e escrivão, com a participação de outros cargos policiais de forma mais periférica.
Dissemos em tese, pois a realidade mostra que os escrivães de polícia, na maioria dos casos, fazem o trabalho enquanto os delegados apenas ratificam o que foi feito (assinam a formalização e montagem do caderno de investigação que "materializa" o inquérito).
Cada cargo tem suas prerrogativas e funções definidas, e cada qual deveria realizar uma parte do trabalho, mas a realidade demonstra um desequilíbrio na relação. Por controlar as ditas polícias judiciárias e suas corregedorias, a classe dominante de delgados criou curvas nas vias retas da lei. Os escrivães acabaram sendo, com o tempo, cada vez mais sobrecarregados e sacrificados, "carregando o piano" sozinhos.
É de conhecimento público que, em grande parte das delegacias de polícia do país, os escrivães formalizam os flagrantes, ouvem suspeitos e testemunhas, intimam, oficiam, enfim, fazem o grosso trabalho, digamos assim, sem a presença física dos delegados. São acionados para irem ao trabalho durante as madrugadas, fora de seu expediente regular de trabalho, cumprem uma escala desumana e atendem e realizam sozinhos os trabalhos.
É no contexto acima que o caso em tela deve ser analisado e eventuais julgamentos prévios feitos pela opinião pública.
Não faremos mais críticas ao modelo, deixando para que cada leitor faça suas próprias pesquisas e tire suas próprias conclusões. Ficaremos por aqui para não nos alongarmos além do objetivo desta manifestação.
Soubemos que, em nota, a Direção da Polícia Civil informou que, assim que tomou conhecimento dos fatos, determinou que a Corregedoria-Geral e a Divisão de Polícia Metropolitana apurassem o caso. “Um procedimento administrativo disciplinar será aberto pela Corregedoria a fim de apurar devidamente os fatos”, informou a corporação.
Esperamos que a referida corregedoria faça sua análise com imparcialidade e livre do forte corporativismo dos delegados, apontando eventuais irregularidades de ambas as partes, não descartando abuso de autoridade, assédio moral, constrangimento ilegal ou qualquer outro entendimento que caiba ao caso por parte do delegado, já que o escrivão já foi, previamente, prejudicado e até sancionado.
Nos colocamos à disposição da representação da classe de escrivães de polícia do estado do Paraná para o que precisarem na defesa da justiça com referência ao colega envolvido.
Associação Nacional dos Escrivães de Polícia Federal - ANEPF