Como resultado da própria condição que o levou a entrar no Brasil, o refugiado busca se inserir no mercado de trabalho brasileiro para deixar no passado uma história de medo e perseguição. De acordo com a Acnur, em página da internet sobre o tema, “refugiados são pessoas que estão fora de seus países de origem por fundados temores de perseguição, conflito, violência ou outras circunstâncias que perturbam seriamente a ordem pública e que, como resultado, necessitam de 'proteção internacional’”.
Este é o caso de Abdulbaset Jarour, 27 anos, imigrante sírio, que tem experiência em administração de empresas. “Eu estava chorando ao mesmo tempo que sorria. Depois de um tempo, vi o mar. Eu respirei aquela liberdade”. Foram pelo menos dois dias na estrada entre Damasco, capital da Síria, e a fronteira do Líbano, até que Abdul conseguisse estar longe da guerra civil que assola o país desde 2011. Natural de Aleppo, ele atuava como empresário, vendendo produtos eletrônicos, e também no Exército. A entrada no Líbano separa a trajetória de Abdul entre o mundo que ele conhecia até aquele momento e a vinda para o Brasil, onde foi acolhido para fugir da guerra.
Abdul lamenta as perdas que resultaram do conflito. “Era uma vida boa, tranquila, confortável. Aleppo era muito linda, histórica. Sou muito orgulhoso. Uma das cidades mais antigas do mundo”, relembra. Para sair do país, ele teve que atravessar a fronteira, tirar novos documentos, pagar atravessadores, tudo isso sem a segurança de que sairia com vida. Em 2015, já no Brasil, recebeu a notícia de que o pai havia morrido na guerra e que a irmã havia perdido uma perna. “Essa notícia me matou”, disse. Hoje a família, de seis irmãos, está espalhada por várias cidades do mundo. “Minha mãe e minha irmã de 12 anos estão em Aleppo. Queria trazer elas pra cá”, disse.
Já a moçambicana Lara Lopes, que trabalhou de camareira quando chegou ao Brasil, até conseguir emprego na área de tecnologia da informação, saiu do seu país para fugir de perseguições em relação à identidade sexual. Ela cita, como uma das situações mais marcantes, o dia em que ela e a então companheira foram levadas à delegacia sem que houvesse motivos. “[Os policiais] insinuavam-se para ela, por terem interpretado que ali existia uma relação não só de amizade. Falavam coisas no sentido de querer fazê-la entender que seria melhor um homem, no caso ele, do que uma mulher que a levou a estar naquela situação. Aquilo me marcou”, relatou. Outra situação impactante para Lara foi a morte de amigas em razão de homofobia.
Lara conta que, apesar de saber que os crimes de ódio à população LGBT também ocorrem no Brasil, ela se sente mais segura porque tem o amparo da lei. “Hoje, se eu sofro algum tipo de agressão, seja física ou psicológica, seja qual for, eu consigo ir a uma delegacia e exigir os meus direitos, diferentemente do meu país. Eu não tenho como fazer isso, porque de vítima eu passo a culpada, porque, na interpretação deles, o que eu estou fazendo é contra as leis familiares, religiosas e morais”, explicou.
Camila Maciel, repórter da Agência Brasil. edição: David Oliveira, Agência Brasil