Um dos principais desafios dos governantes a serem eleitos em outubro deste ano será melhorar a qualidade de vida da população brasileira. Temas como saúde, educação, emprego e segurança estão presentes em pesquisas sobre as preocupações dos brasileiros e os setores que precisam avançar no país. A Agência Brasil publica reportagens sobre boas práticas desenvolvidas pelo país e também sobre os problemas a serem enfrentados. Na abertura da série, o tema será segurança pública reproduzido nesta página do SINDPOLF/SP.
O Atlas da Violência, estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, tem colocado Jaraguá do Sul (SC), como um dos municípios mais seguros do país. Os dados divulgados neste ano revelam que, em 2016, a cidade teve 5,1 homicídios por grupo de 100 mil habitantes.
Na outra ponta está Queimados (RJ), município da Baixada Fluminense, que registrou 134,9 homicídios por grupo de 100 mil habitantes. A taxa brasileira chegou a 30,3 homicídios por grupo de 100 mil habitantes - 30 vezes maior do que a média da Europa.
Desenvolvimento
Jaraguá do Sul, por Antonio Cruz/ Agência Brasil
Cercada de montanhas da cadeia da Serra do Mar, Jaraguá do Sul fica em um vale no norte catarinense, tem 170 mil habitantes e ainda guarda a tranquilidade de uma cidade do interior. Os vizinhos se conhecem, e qualquer pessoa estranha chama a atenção. No verão, alguns até dormem com as janelas abertas. Outros arriscam deixar o carro destrancado em frente de casa. O índice de mortes violentas na cidade é o terceiro menor do país.
A qualidade de vida em Jaraguá do Sul é evidente. A cidade tem Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) alto – 0,803 em uma escala de 0 a 1. As ruas são limpas e 88% das casas têm esgotamento sanitário adequado. O Produto Interno Bruto (PIB) per capita chegou a R$ 40.504,39 em 2015, enquanto a média nacional foi de R$ 28.876, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mais de 98% das crianças e adolescentes entre 6 e 14 anos estão na escola.
Cidade industrial com forte presença nos setores metal-mecânico e têxtil, tem alto nível de empregabilidade, principalmente de mão de obra qualificada. Segundo o presidente da Associação Empresarial de Jaraguá do Sul (ACIJS), Anselmo Luiz Jorge Ramos, até a crise econômica, o desemprego era de 2% a 3%, agora gira em torno de 7%. “Mas estamos revertendo esse índice”, afirma. A média nacional de desemprego é de 12,7% da população economicamente ativa.
Integração
Além da qualidade de vida, outros fatores são apresentados pelas autoridades e pelos moradores para justificar o título de uma das cidades mais seguras do país, começando por uma integração entre as forças de segurança, o Poder Público e a comunidade. “Aqui temos um bom diálogo entre o Ministério Público, o Poder Judiciário, a Defensoria Pública, a Polícia Militar, a Polícia Civil, a unidade prisional e a comunidade”, conta o juiz José Aranha Pacheco, da 2ª Vara Criminal de Jaraguá do Sul.
Trabalho comunitário permite ressocialização de presos em Jaraguá
A ressocialização dos apenados que passam pelo Presídio Regional de Jaraguá do Sul, a atuação do Conselho Comunitário Penitenciário e o monitoramento de presos em regime aberto são apontadas como essenciais para garantir os baixos índices de violência na cidade catarinense. O presídio tem 349 vagas, mas atualmente abriga 537 apenados. Desse total, 78,9% realizam alguma atividade, seja trabalho na própria unidade prisional, trabalho externo, estudo ou leitura.
São 47 presos trabalhando na cozinha e no setor administrativo da unidade prisional, 156 ocupados nas oficinas instaladas no presídio por empresas conveniadas dos setores têxtil e metal-mecânico, seis fazendo atividades externas, 70 cursando ensino fundamental e médio, cinco fazendo curso superior e 140 participando do programa de remissão pela leitura.
O Conselho Comunitário Penitenciário de Jaraguá do Sul tem forte atuação não só no processo de ressocialização dos apenados, mas principalmente no atendimento a demandas por melhorias da unidade prisional. O conselho tem a colaboração do empresariado local e da Justiça, que repassa verbas das multas. “Nosso papel é fortalecer o trabalho realizado no presídio. O estado não consegue custear 100% das despesas. É aí que entramos”, explica a presidente do conselho, assistente social Josiane Gonzaga dos Santos.
Neste ano, o conselho já aprovou a reforma da cozinha do presídio para transformá-la em industrial, com instalação de câmara fria para conservação dos alimentos. O custo da obra será de R$ 690 mil. Também será instalada uma tenda para a realização de cursos de qualificação profissional dos apenados, um investimento de R$ 7.400, com recursos do conselho. “Se ficarmos dependendo do estado, o preso não é atendido”, diz. “Não podemos esquecer que as pessoas chegam ali, na maioria das vezes, em razão das fragilidades das nossas políticas públicas”, argumenta.
Diariamente, a Polícia Militar monitora os 250 apenadas em regime aberto. À noite, os policiais fazem visitas surpresas nas residências dos presos para verificar se eles estão no local, conforme determinado pela Justiça. “Quem não estiver em casa terá que dar explicações à Justiça e poderá perder o benefício da progressão de pena”, afirma o comandante do 14º Batalhão da PM, Gildo Martins de Andrade Filho. A PM e a Justiça trabalham no desenvolvimento de um aplicativo para aprimorar o controle dos apenados em regime aberto.
Cidade mais violenta do país, Queimados pede mais policiamento
Queimados, por Tomaz Silva/Agência Brasil/Agência Brasil
Quem chega ao município de Queimados, na Baixada Fluminense, tem a impressão de uma calma aparente, típica das pequenas cidades do interior. Ao lado da estação de trem, aposentados jogam damas na pracinha e pessoas perambulam pelo comércio. Nada que faça suspeitar que o local é classificado como o mais violento do Brasil, segundo a última edição do Atlas da Violência, publicação do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O combate à violência será um dos desafios dos governantes que serão eleitos em outubro e a segurança pública é um temas das reportagens especiais da Agência Brasil sobre as eleições 2018.
O relatório, lançado em junho passado, referente a 2016, apontou o recorde de 134,9 homicídios e mortes violentas por 100 mil habitantes em Queimados, que fica a 50 quilômetros da capital. A média nacional, nesse mesmo ano, para municípios com mais de 100 mil habitantes, foi de 38 homicídios, quase quatro vezes menos. Queimados tem 145 mil habitantes.
Esse título de campeã não orgulha, é claro, nenhum de seus habitantes. Pelo contrário. Alguns acham exagerado o número e se dizem tranquilos ao andar pelas ruas. Outros, reconhecem que há violência na cidade, mas creditam a locais específicos, como as três comunidades existentes. “Acho absurda essa fama. Insegurança tem em todas as cidades do país. Aqui tem bairros perigosos, mas eu nunca fui assaltado. À noite é que as pessoas preferem ficar em casa e eu mesmo não trabalho depois das 20h”, disse o taxista Hélio Júnior da Silva Melo, cujo ponto é próximo à estação de trem e à pracinha, onde grupos se reúnem em torno de mesas de concreto com tabuleiros de dama pintadas.
A praça fica quase em frente ao Morro da Caixa D´Água, considerado um dos mais violentos da cidade, do outro lado da linha do trem. “Lá no Rio é mil vezes pior. Eu não tenho medo de andar na rua. A qualquer hora, eu saio”, garantiu o ambulante Ailton de Paula, sendo rebatido pelo aposentado João Martins. “Aqui em Queimados é perigoso sim. No Morro São Simão, toda noite matam gente. Ali na Pedreira, expulsaram morador. É muito violento. É milícia com bandido, é bandido com polícia. É geral”, disse João. Segundo o aposentado, no asfalto não há ocorrência de tiros ou mortes. O problema, segundo ele, são os furtos de celular, praticados por ladrões que vêm de bicicleta e arrancam o aparelho da mão das vítimas. Assaltos a lojas acontecem, mas são raros.
Queimados mostra falta de políticas para segurança, diz pesquisadora
Os altos índices de violência no município de Queimados, na Baixada Fluminense, apontados pela última edição do Atlas da Violência, não devem ser naturalizados, mas sim servirem como estímulo à resolução dos problemas. A análise é da especialista em segurança pública Sílvia Ramos, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec).
“É possível reduzir os homicídios, sim. E eu espero que os agentes de segurança do Rio usem Queimados não como um caso para mostrar como o Rio é violento. Mas para mostrar como é possível reduzir homicídios”, disse.
Ela diz acreditar que o problema da violência no município tem solução, unindo esforços nas esferas públicas, federal, estadual e municipal. “Redução de homicídios tem jeito sim. Com três ou quatro políticas em Queimados, em quatro meses a gente baixa [os índices]. Tem que haver foco articulado na milícia, na elucidação de homicídios múltiplos, onde morre mais de uma pessoa. Pois às vezes tem um grupo que mata 10, 20 pessoas. Enquanto você não tira esse grupo de circulação, ele continua matando. Também é preciso foco articulado na redução dos tiroteios e dos confrontos. E investimento em inteligência”, destacou a especialista.
Para ela, os números mostrados no Atlas da Violência, que apontaram 135 mortes violentas por 100 mil habitantes em 2016 em Queimados, e tornaram a cidade campeã neste quesito no país, não são novidades.
“O Atlas da Violência confirma, de forma chocante, a impressão que tínhamos há muitos anos da Baixada, de tanto que não foi feito nada lá. Há 30 anos a taxa de homicídios da Baixada é maior que a taxa média da capital, do Rio de Janeiro. Sendo que o Rio sempre foi um caso grave, do ponto de vista do Brasil e do mundo. A Baixada é um contexto gravíssimo no contexto do Rio. Nós alertamos isso há muitos anos”, afirmou a especialista.
Segundo ela, a implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) na capital, principalmente nos anos que antecederam a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos, acabou se refletindo na região de forma positiva. E com a precarização do projeto, a violência que explodiu no Rio também respingou na Baixada Fluminense.
“Na época em que os homicídios foram reduzidos no Rio, por causa das UPPs, de 2012 a 2014, a Baixada também reduziu [os índices], mas a distância da taxa [de homicídios] da Baixada e do Rio nunca foi reduzida. E com o fim das UPPs, a Baixada subiu mais do que os outros lugares na taxa de homicídios. A ponto de que esse caso de Queimados virou uma espécie de paroxismo, do que pode acontecer quando um lugar está tendo problemas de violência e políticas específicas não estão sendo desenvolvidas para reduzi-los”. Para ela, os números mostrados no Atlas da Violência, que apontaram 135 mortes violentas por 100 mil habitantes em 2016 em Queimados, e tornaram a cidade campeã neste quesito no país, não são novidades. “O Atlas da Violência confirma, de forma chocante, a impressão que tínhamos há muitos anos da Baixada, de tanto que não foi feito nada lá. Há 30 anos a taxa de homicídios da Baixada é maior que a taxa média da capital, do Rio de Janeiro. Sendo que o Rio sempre foi um caso grave, do ponto de vista do Brasil e do mundo. A Baixada é um contexto gravíssimo no contexto do Rio. Nós alertamos isso há muitos anos”, afirmou a especialista.
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Edição: Carolina Pimentel
Imagens: Tomaz Silva/Agência Brasil Antonio Cruz/ Agência Brasil
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Silva/Agência Brasil
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