No Dia Internacional Contra a Corrupção, 9 de dezembro de 2021 , o SINPF/SP , destacando o protagonismo que os policiais federais possuem no combate à corrupção e lavagem de dinheiro , entrevistou o Agente de Polícia Federal Carlos H. Firmino de Oliveira sobre o combate à lavagem de dinheiro, meio muitas vezes utilizado para ocultar e dissimular valores provenientes de atos ilícitos, inclusive a corrupção.
O Agente Firmino é Mestre em Economia e doutorando em Administração. Presidiu o Instituto dos Profissionais de de Prevenção à Lavagem de Dinheiro(IPLD) e foi eleito para compor o Conselho Deliberativo da Funpresp (2021-2024).
1. Como você definiria o conceito de lavagem de dinheiro?
Existe ampla literatura jurídica que se propõe a conceituar a lavagem de dinheiro, inclusive um tipo penal específico que criminaliza essa conduta no Brasil. Porém, explicando resumidamente a um público leigo, lavagem de dinheiro é qualquer ato que vise dissociar a origem criminosa de um determinado bem obtido por meio do cometimento de infrações penais.
2. Quais são os impactos disso na sociedade brasileira?
No Brasil e no mundo, a lavagem de dinheiro representa ameaça às instituições democráticas. Ela permite que organizações criminosas e seus membros prosperem economicamente. Tomemos como exemplo uma ORCRIM especializada em corrupção de agentes públicos e desvio de recursos públicos. Se essa ORCRIM encontrar facilidade para pagar seus atos de corrupção e dissimular seus ganhos ilícitos, ela tenderá a desviar cada vez mais recursos públicos e praticar mais atos de corrupção em um ciclo vicioso que deteriora o nosso tecido social. Uma ação da PF que ilustra esse drama é a operação Prato feito, que mirou na organização instalada em dezenas de prefeituras e que tinha o objetivo de desviar recursos da merenda escolar. Ou seja, os criminosos almejavam enriquecer às custas da alimentação deficiente oferecida a milhões de crianças.
3. Como a PF age no combate à lavagem de dinheiro?
Por ser um crime transversal que está intrinsecamente ligado a todas os tipos de crimes praticados por organizações criminosas, a PF combate a lavagem de dinheiro em múltiplas frentes. A mais visível é nas deflagrações operações policiais televisionadas. Nessas ocasiões, policiais federais vão aos endereços de pessoas investigadas a fim de obterem provas materiais da lavagem de dinheiro e dos crimes que antecederam a lavagem. A PF também está em uma rede de inteligência financeira que começa nas instituições privadas obrigadas a reportar situações suspeitas ao COAF, passa por análises de big data sobre essas informações e termina com o direcionamento a autoridades que possam investigar essas suspeitas. Nada disso seria possível sem a capacitação específica provida pela Academia Nacional de Polícia por meio de ações como o Curso de Investigação e Análise Financeira(CIAF). Curso voltado a Policiais Federais, mas que recebe convidados de outras instituições nacionais e até de outros países.
4. Quais outros órgãos são responsáveis por esse combate?
O combate à lavagem de dinheiro começa com a sua prevenção. Nesse sentido, o Banco Central do Brasil teve pioneirismo nas regulações focadas nesse tema por conta do maior risco associado às atividades comerciais de seus regulados (instituições financeiras e de câmbio). Com a lei 9.613\1998, outros setores da economia passaram a ser regulados com esse enfoque preventivo também e foi criado o COAF, nossa Unidade de Inteligência Financeira (UIF). Outro marco é a criação da ENCCLA(Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro) em 2003, que congrega um grande número de instituições com interesse e participação no combate à lavagem de dinheiro no Brasil. Todavia, os órgãos de persecução criminal são os que, de fato, operacionalizam o combate à lavagem de dinheiro. Seja pelas investigações criminais de sua atribuição, seja pela ação penal correspondente.
5. Você vê esse problema sendo solucionado tão cedo no Brasil?
Apesar das limitações orçamentárias e institucionais de nosso tempo, o Brasil dispõe de meios avançados de prevenção e repressão à lavagem de dinheiro. Seja pelos mecanismos jurídicos postos à disposição da polícia judiciária e do ministério público, seja pelas obrigações regulatórias impostas ao setor privado. Após 20 anos de serviço público, tendo atuado como professor da Academia Nacional de Polícia, trabalhado no Lab-LD da PF, presidido uma organização privada na área de PLD-FT, entendo que o maior gargalo está na capacitação dos profissionais de segurança pública para trabalhar a infinidade de dados gerados pelo sistema de inteligência financeira e pelas fontes protegidas por sigilo (mediante autorização judicial). Mais ainda, entenderem que tipo de dado seria informação útil para convencer o juiz e levar a uma condenação. Toda essa capacitação só vai fazer sentido quando este mesmo profissional tiver um plano de carreira que o motive a se desenvolver na sua profissão. Se esta solução virá cedo, tarde ou nunca, só depende do espírito público e vontade política dos gestores públicos envolvidos.